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Monumento em homenagem a Getúlio Vargas fará 60 anos
Há 60 anos, no dia 26 de setembro de 1958, o então vice-presidente da República João Goulart participou da inauguração do monumento em homenagem ao ex-presidente Getúlio Vargas, em Lages. Idealizado pelo arquiteto João Argon Preto de Oliveira, foi instalado na Praça João Ribeiro, no Centro da cidade.
Nos últimos anos, a estrutura não recebeu manutenção. A Prefeitura nega que esteja, novamente, cogitando trocá-lo de local, entretanto não descarta discutir o assunto.
Segundo publicou a colunista política do Correio Lageano, Olivete Salmória, na edição do dia 16 de abril, a intenção seria de levar a estrutura para Praça da Imprensa, no início da Avenida Presidente Vargas, próximo à Praça da Bandeira. O Correio Lageano realizou uma enquete no Facebook para saber a opinião das pessoas e, das 586 que votaram, 69% são contra a retirada e 31% favoráveis.
Essa não é a primeira vez que se discute a retirada do monumento da Praça João Ribeiro. Em 2014, a Prefeitura foi questionada e, na época também não havia projeto. A justificativa, nas duas vezes, seria de que a estrutura bloqueia a visão da Catedral, patrimônio tombado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC).
A arquiteta, professora universitária e mestre em preservação do patrimônio cultural, Lilian Fabre, não concorda com esse argumento. “O monumento foi pensado para compor com essa vista, não como bloqueio, se for pensar assim, a gente tem um prédio imenso ao lado da Catedral que bloqueia e polui muito mais a vista da Catedral”, reflete.
Ela defende um debate mais amplo sobre o destino desse monumento, como todo patrimônio em Lages. E ressalta a relevância do monumento que foi construído pelo primeiro arquiteto de Lages, João Argon Preto de Oliveira.
O que diz a Prefeitura
O superintendente da Fundação Cultural de Lages, Gilberto Ronconi, afirma que não há intenção, neste momento, de retirar o monumento. “Eu, particularmente, acho prudente abrir conversa com o arquiteto que fez o projeto e com entidades.”
Em 2016, o Conselho Municipal de Patrimônio Cultural (Compac), segundo Ronconi, que presidente a entidade, teria consultado a Fundação Catarinense de Cultura (FCC) sobre a retirada e o parecer foi que a decisão deve ser do município.
O Conselho não teria chegado a uma decisão sobre o caso. Caso se deicidas pela retirada, a intenção seria levar a estrutura para a Praça da Imprensa, no início da Presidente Vargas, já que, de acordo com ele, as praças de Lages serão revitalizadas.
Segundo o secretário de Meio Ambiente e Serviços Públicos de Lages, Euclides Mecabô, ‘várias pessoas estão fazendo solicitação, verbal e por telefone’, porém ele não sabe dizer quantas pessoas. Informa, ainda, que essas pessoas dizem que o local é inadequado, entretanto, afirma não ter conhecimento de estudo para a retirada do monumento.
“As pessoas que me procuram dizem que o monumento atrapalha a visão da Catedral”, questionado se as árvores também não estariam atrapalhando a vista da igreja, diz que “as pessoas não falaram nada sobre as árvores’.
Sobre a restauração, Mecabô garante que não há projeto, apenas fazem as manutenção da limpeza. “Dá para conversar sobre isso, mas, por enquanto, não tem nada, nem de mudar de local, nem para mudar a estrutura do local”, explica.
Primeiro arquiteto de Lages projetou o monumento
O primeiro arquiteto da Serra Catarinense nasceu em Porto Alegre há 87 anos, onde também frequentou o primeiro curso de Arquitetura do Sul do Brasil, na Universidade Federal. João Argon Preto de Oliveira foi o responsável por projetar a Praça João Ribeiro e o monumento em homenagem a Getúlio Vargas. A estrutura, que foi inaugurada em 1958, começou a ser projetada em 1955.
A obra destaca a vida e a presidência de Getúlio Vargas. No fundo há um painel que retrata os trabalhadores brasileiros do campo e da indústria, também inseriu na obra, para valorizar a região, desenhos de araucárias. Nos anos de 1950, a Praça era de terra, ele lembra que não havia o busto do Bispo Dom Daniel Hostin, falecido em 1973, os outros que, integram a praça, já estavam lá.
O arquiteto aposentado explica que quando projetou o monumento pensou numa estrutura que compusesse com o prédio da Catedral. Segundo ele, os dois juntos compõem um visual harmônico. Sobre a retirada da estrutura, acredita que é mais “distorção de caráter político do que visual”. Também lamenta a falta de manutenção da praça e do monumento.
Entretanto, esclarece que não foi decisão exclusiva dele a escolha do local, mas de um conjunto de pessoas. João Preto era do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e votou em Getúlio Vargas em 1950. Lembra que o busto do ex-presidente foi comprado, e o projeto previa que fosse maior .
O lageano Fabiano Garcia é mestre em História pela Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc) e falou com exclusividade para o Correio Lageano, sobre uma possível interferência no monumento que homenageia Getúlio Vargas.
Correio Lageano_ É importante a manutenção do monumento onde ele está? Por quê?
Fabiano Garcia_ É uma pergunta que exige uma resposta com diferentes perspectivas. A manutenção do monumento onde está, sem sombra de dúvidas, mantém assegurada a originalidade do projeto e preserva sua historicidade, o que é fundamental. Afinal, mantemos laços afetivos com aquele lugar. E, o mais importante, conserva a composição da paisagem urbana de Lages que, após 1958, é composta pelo monumento em frente à Igreja. Ou seja, nos remete à própria modernização da cidade. É natural que haja divergências quanto à melhor disposição da vista da Igreja, que também é um patrimônio histórico. Até porque essas disputas também possuem historicidade. Politicamente falando, não me parece à toa, por exemplo, que o lugar escolhido para a construção de um monumento dedicado a um estadista como Getúlio Vargas, seja justamente em frente à matriz da Igreja Católica na região serrana, em uma praça repleta de bustos ligados, entre outros, ao poder religioso. Talvez, num sentido mais profundo, o monumento nos remeta ao processo republicano, à laicização do Estado e nossa precária e contínua secularização. Agora, deixe-se claro, que a manutenção e a mudança de local de um monumento não é uma questão de “opinião”, mesmo porque, em geral, não há educação patrimonial do público, o que exigiria bastante debate e que instâncias locais puxassem uma discussão mais ampla, com o Conselho Municipal de Patrimônio e os demais responsáveis inclusos.
Hoje, o monumento está abandonado, seria já uma estratégia deixá-lo sem conservação para justificar a sua retirada?
Infelizmente, sabemos que essa é uma prática recorrente do poder público de Lages e que também ocorre no Estado, de modo generalizado. Em geral, com exceções de alguns casos isolados, não há consciência histórica por parte dos nossos representantes e nem a devida valorização dos patrimônios históricos, sempre vistos como “problemas” ao “desenvolvimento”. Em dias em que tudo é mercadoria, o valor social de um imóvel ou de um monumento fica às minguas.
O que significa esse movimento das forças políticas e econômicas para a retirada do monumento?
Como toda disputa no campo cultural, representa uma questão de poder simbólico. Tirar Getúlio da praça – em tempos em que se questiona a validade da Legislação Trabalhista e todo legado varguista na nossa história – é também assegurar que os valores tradicionais de alguns prevaleça sobre a maioria. É o retorno do poder sacro em tempos em os valores republicanos estão totalmente abalados.
Parece que Lages não valoriza alguns símbolos históricos, como Aristiliano por exemplo, o Museu, o Monumento e, de outro lado, supervaloriza a Catedral, o prédio do Centro Cultural (Colégio Rosa), você concorda com isso?
Há, sim, certo desprezo pelos bens culturais em Lages. E isso não se deve à falta de esforços realizados por membros da secretaria de cultura e dos conselhos. O trabalho dessa gente, muitas vezes ignorado, é precioso e garante a Lages um mínimo de valorização histórica da cidade. Em geral, o que se tem, é um profundo desprezo por aquilo que não rende lucro. Um imóvel antigo, um monumento, uma biblioteca, não é bem quisto por aqueles que têm influência no debate público e poder aquisitivo suficientes para investir na cidade – o que na verdade, em termos de patrimônio, é outra bobagem, basta lembrar o que os municípios têm feito para aliar preservação histórica e turismo. É uma visão atrasada de desenvolvimento urbano e bastante equivocada, politicamente falando. Sem contar a questão da educação patrimonial que é quase nula nas salas de aula, sempre contando com os esforços sobre-humanos dos professores e professoras que não contam com apoio do poder público.