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Preservação ambiental e produção de orgânicos em sintonia

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Foto: Susana Küster

O cheiro da mata, o barulho dos passarinhos e das galinhas, o mugido do gado e o som do rio, descrevem o Sítio Orgânicos Pessegueiros, que fica no interior de Bocaina do Sul, na Localidade de Pessegueiros. A paisagem verde se mescla com as cores da lavoura, totalmente orgânica.

Orlando Ribeiro Melo, conhecido como Sossó, planta e vende repolho, alface, beterraba, ervilha, vagem, feijão, rúcula, couve, tempero verde, cebola, milho, moranga, pepino, melancia, tomate, cenoura, morango, entre outros. Para quem quiser provar o sabor de um alimento orgânico dele e de outros produtores, pode ir na feira do CAV, que acontece toda quarta-feira, às 8 horas ou na Uniplac, às sextas-feiras, no mesmo horário.

O sítio dele possui 147 mil metros quadrados, sendo que 37,5 mil metros quadrados são destinados para a preservação da mata nativa. O restante da área se divide entre produção de orgânicos e de peixe, criação de gado para consumo próprio, e muitas árvores, de vários tipos. E, ele quer plantar mais, pelo menos mais um hectare com árvores.

A ideia de preservar a mata nativa sempre foi considerada importante pelo agricultor. “Se não tiver mata nativa, não tem sombra, não tem abelha, diminui a água, e não tem vida. A mata, inclusive, serve de barreira do ar contaminado de agrotóxicos que vem de outros locais, assim, minha produção fica livre de veneno.” 

E isso é papo de quem entende do que está falando. Ele percebeu que quando tinha mais mata nativa nas redondezas, a água do Rio Pântano Feio, que circunda a propriedade, era bem mais forte do que é hoje.

“Quanto mais corta árvore, menos água tem. Isso eu vi acontecer aqui! Esse pinheiro americano é uma praga porque chupa muita água, eu cortei a maioria dos que tinha na minha propriedade, sobraram poucos e vou cortar todos para plantar árvores melhores.”

Grande parte do que planta em sua propriedade vem do Paraná, de um órgão chamado Vianei e algumas são da Bahia, de um seminário que ele foi para trocar sementes e aprender mais sobre produção orgânica.

A propriedade de Sossó é um exemplo de como é possível produzir bem, em pouco espaço e sem agrotóxico, a ponto de alunos do Centro de Ciências Agroveterinárias (CAV/Udesc) irem até lá para aprenderem, na prática, o que estudam na universidade.

Orgânico com certificado

Ele frisa que para ser orgânico, o produtor precisa provar, porque muitos dizem que são, mas trabalham com agrotóxico. O agricultor possui certificado de conformidade orgânica expedido pela Associação Ecovida de Certificação Participativa, que é renovado todo ano e possui uma fiscalização intensa para verificar como são produzidos os alimentos. “Inclusive, eles colhem amostras e fazem testes em Florianópolis para checar se não tem agrotóxico”.

Sossó acredita que são poucos os agricultores que produzem orgânicos, por conta do trabalho que é bem maior, do que plantar com agrotóxico. “Quando surge alguma praga, o que é raro, porque fico de olho, faço uma mistura com cebola, alho, cavalinha (mato), cravo e pimenta e deixo no escuro por uns 15 dias. Aí coloco 10 litros de água em um copo de mistura e jogo onde precisa.”

Mudança de vida foi radical

Hoje, Sossó não se vê trabalhando em outro ofício. Ele conta com orgulho que deixou a vida de profissional efetivo da Prefeitura de Bocaina para trabalhar no sítio. Encara a mudança de profissão para melhor, pois percebe que sua saúde melhorou e frisa que ajuda outras pessoas a terem saúde, por meio de seus produtos orgânicos. 

Quem vê a propriedade, não imagina que tudo foi feito aos poucos e sem pressa para obter grandes lucros. “Eu nunca fiz empréstimo, tudo que sobra invisto, nem que sejam R$ 50. Aos poucos, fui plantando e colhendo. Tudo eu aproveito, desde resto de madeira para fazer a estufa das hortaliças, até as pedras para fortalecer o açude”. O objetivo dele, agora, é fazer um pesque-pague no açude em que produz diversas variedades de peixe.

Dos cerca de 80 moradores que moram na Localidade de Pessegueiros, Sossó conta que somente ele trabalha sem agrotóxico. E faz toda a lida do campo sozinho, já que sua esposa cuida da casa e seus filhos, todos casados, não moram com o casal. 

Santa Catarina amplia cobertura de mata nativa no meio rural

Um estudo realizado pelo Centro de Socioeconomia e Planejamento Agrícola (Epagri/Cepa), comparando os números do Censo Agropecuário de 1980 e 2017, demonstrou as mudanças que ocorreram na área agrícola do Estado em quase 40 anos.

Santa Catarina conseguiu se tornar um gigante do agronegócio brasileiro, aumentando a produtividade, reduzindo a área de lavouras e cuidando das florestas nativas. Hoje, a mata nativa ocupa 26,2% da área das propriedades rurais catarinenses, o maior índice desde 1970, início da série histórica e quando começou a expansão agrícola no Estado.

Atualmente, as propriedades rurais ocupam 67,3% do território catarinense, são 6,4 milhões de hectares destinados à produção agropecuária. Dessa área, 40,4% estão cobertos de florestas nativas ou plantadas (2,6 milhões de hectares); 28,4% são utilizados para pastagem (1,8 milhões de hectares) e 22,9% para lavouras (1,5 milhão de hectares).

“Santa Catarina mostra que é possível produzir mais alimentos e diminuir a pressão sobre os recursos ambientais. Nossa intenção é fazer com que a produção agropecuária ande de mãos dadas com a preservação ambiental. A expectativa é que a produção de alimentos aumente ainda mais, nos próximos anos, em áreas menores e com florestas nativas mais extensas,” explica o secretário de Estado da Agricultura e da Pesca, Ricardo de Gouvêa. 

Preservação

Segundo análise da Epagri/Cepa, houve redução na área total de lavouras e pastagens nas últimas décadas em Santa Catarina. Ao mesmo passo que as terras ocupadas com matas nativas e plantadas vêm aumentando ao longo do tempo. 

Hoje, Santa Catarina tem uma cobertura 20% maior de mata nativa do que nos anos 80, com 278,8 mil hectares a mais de vegetação natural. Sem contar a área destinada às florestas plantadas, que também aumentou 145,4% no mesmo período. De acordo com o analista da Epagri/Cepa, Luiz Toresan, a tendência é que as áreas de floresta nativa aumentem ainda mais ao longo dos anos devido à regeneração de novas áreas e também à legislação que impede o desmatamento em áreas maiores. 

Fonte: Epagri/Cepa

Produção e preservação como aliadas

Com matas preservadas e uma área menor destinada às culturas anuais, os produtores catarinenses investiram em tecnologias para aumentar a produtividade. Um bom exemplo é a queda de 27,8% na área plantada de grãos, entre 1980 e 2017, e o aumento de 106% na quantidade produzida.

Essa relação acontece também com o milho, um dos grãos mais importantes para o agronegócio catarinense, a produção aumentou 46,3% nesse período mesmo com uma área 54,8% menor. 

A explicação é o aumento na produtividade das lavouras pelo uso de mais tecnologia. Os produtores, que colhiam 2,3 toneladas de milho por hectare em 1980, passaram a ter uma das maiores produtividades do Brasil com 7,5 toneladas por hectare. No caso da soja, os produtores ampliaram a área plantada em 24,8% e o crescimento na produção foi de 261,5%, com uma produtividade três vezes maior. 

As estimativas da Epagri/Cepa apontam para uma produtividade média cada vez maior nas lavouras catarinenses, já que muitos produtores ainda podem obter um rendimento melhor por hectare.

De 1980 a 2017, a área ocupada com pastagens também perdeu espaço, com diminuição de 39,4% nas pastagens nativas. Contudo, as pastagens plantadas, destinadas à produção de carne e leite, aumentaram 15,5% no mesmo período. 

Postos de trabalho

A diminuição na área plantada, as economias de escala, o crescente uso de tecnologias tiveram impacto direto também no número de postos de trabalho gerados pela agropecuária catarinense. Em 1980, eram 858,7 mil pessoas ocupadas. Esse número passou para 497,8 mil pessoas em 2017, gerando uma redução de 42%.

“A tendência é de termos um meio rural cada vez mais profissionalizado, com uso de tecnologias que permitam produzir mais alimentos em áreas menores e utilizando menos mão de obra. Essa é uma tendência mundial e não será diferente em Santa Catarina. O que queremos construir é um meio rural competitivo, que gere renda e qualidade de vida para quem permanecer no campo”, destaca o secretário de Estado da Agricultura e da Pesca, Ricardo de Gouvêa.

Fonte: Epagri/Cepa

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