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Migrantes, trecheiros e moradores de rua, como é a vida sem um lar

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Brenda e Moisés viajam pelas cidades para conseguir emprego - Foto: Andressa Ramos

A vida na rua não é fácil. Para alguns, é a fuga da violência doméstica. Para outros, são as drogas que levam para esse caminho e retornar não está entre as opções. Há quem tenha saído de casa, da sua cidade natal em busca de emprego em municípios conhecidos por oportunizar empregos nas safras das colheitas. São homens e mulheres, jovens e idosos que vivem cada dia trilhando caminhos diferentes, uns com objetivos, outros vivendo um dia de cada vez.

Lages, na Serra Catarinense, é uma das cidades de passagem para trabalhadores. Os chamados trecheiros, que largam seu lares em busca de trabalho nas lavouras das cidades do interior. Porém, muitos acabam em situação de rua, pela desvalorização da mão-de-obra, os baixos salários que, às vezes, não são pagos e a preferência pelos estrangeiros, que possibilita aos empregadores pagar salários mais baixos ainda pela mesma mão-de-obra.

Rafael William Souto, de 36 anos, saiu há 12 anos de Curitiba. Pela dificuldade de conseguir um emprego, colocou uma mochila nas costas e saiu. Em Lages há alguns dias, percebe que grandes empregadores estão optando por estrangeiros haitianos e venezuelanos, que recebem pouco e trabalham na mesma proporção dos brasileiros. Rafael está em busca de trabalho, mas não pretende retornar para Curitiba.

Suporte

Para atender pessoas como Rafael, que chegam a Lages e não têm dinheiro para se hospedar, tomar banho e fazer as refeições, além dos moradores de rua que, na maioria dos casos são usuários de drogas, o Centro de Referência Especializado para População de Rua (Centro POP) abre as portas diariamente para oferecer um atendimento humanizado e especial.

O serviço começa logo cedo, com um café da manhã reforçado. Os moradores de rua, trecheiros e mochileiros, chegam aos poucos. Depois do café da manhã, eles passam por atendimento psicológico, assistencial e também fazem atividades físicas e de artesanato.

Um lanche pouco depois das 10 horas é servido. Às 11 horas, de ontem, cerca de 40 pessoas haviam feito o cadastro para o almoço. Em média, o Centro POP recebe, todos os dias, no mínimo 50 pessoas, a maioria homens.

Quem faz a refeição deve lavar a louça e organizar a cozinha. Além do almoço, eles têm direito, também, a um café da tarde reforçado, pois é a última refeição antes de voltarem para a rua ou ao acolhimento para dormir. Só pode ficar no acolhimento para a noite, quem está livre de vícios das drogas.

Durante todo o dia, a casa está de portas abertas, mas quem entra no Centro POP, localizado à Rua São Joaquim, deve fazer um cadastro e apontar o que deseja fazer. A coordenadora da unidade e assistente social, Mara Rita da Silva, explica que todos têm direito a tomar banho, lavar as roupas e são atendidos para que possam ter seus direitos garantidos.

Quem deseja sair das drogas é encaminhado ao Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (Caps AD) e o contato de aproximação da família é retomado. É preciso desmistificar, segundo Mara, que quem vive na rua é pobre. Muitos são de classe média baixa, média e classe alta, e muitas das pessoas que vivem nas ruas são usuários de drogas e as famílias acabam abandonando, desistindo ou não têm mais esperanças.

Migrantes e imigrantes também são acolhidos

Há quem esteja em Lages, mas seja de municípios vizinhos e até mesmo estados distantes. Quem quer voltar para casa ganha apoio do Centro POP e da Prefeitura. Mara explica que, mensalmente, cerca de 40 passagens são liberadas e usadas. Elas se esgotam.

Neste mês, cerca de 20 migrantes passaram por Lages, vítimas da frustração das colheitas. Iludidos pela facilidade de assinar a carteira, abrigo e um bom salário, os migrantes acabam na rua, tendo de descobrir novas cidades para conseguir novos empregos.

Brenda da Rosa Mesquita, de 23 anos, é natural de Porto Alegre. Mãe de dois filhos, precisou fugir de casa por sofrer violência doméstica constante do ex-marido. Ele também espancava o filho mais velho de Brenda. Por fugir de casa, perdeu os filhos para o abrigo, mas, agora, está em busca de estabilidade financeira e residencial para ter as crianças de volta. Sente muita saudade.

Ao ir para Canoas, no Rio Grande do Sul, conheceu Moisés Batista Nunes, de 25 anos, com quem viaja pelas cidades para conseguir emprego. Há três dias em Lages, o casal quer um emprego de carteira assinada, pois o processo da guarda dos filhos tramita em Vacaria e seria mais fácil para buscá-los e começar uma vida nova.

Enquanto isso, usam os serviços do Centro POP e Acolhimento para sobreviver na cidade. Brenda é dona de uma ótima oratória e determinação. Moisés quer ter um lar, mas depois disso, criar uma organização para atender pessoas que estão em situação de rua.

Mudança de vida

Emilson Roberto Amaral Correa, de 28 anos, estava visitando os profissionais e amigos que fez no Centro POP. Há oito meses, construiu uma nova vida. Está livre das drogas, alugou uma casa, casou-se e está trabalhando no setor da construção civil. “Se não fosse o apoio inicial do pessoal aqui do Centro POP, eu não estaria onde estou hoje.”

Uma chance

Genilson Abel Ribeiro, 32 anos, já foi matéria no Correio Lageano. Ele pedia uma vaga de emprego. Conseguiu, mas por ter de ir ao Fórum todas as quintas-feiras a empresa de chapeação optou por mandá-lo embora. Agora, utiliza de suas habilidades manuais para fazer e vender artesanatos, mas ainda quer uma chance.

Segundo ele, é isso que as pessoas moradoras de rua precisam. Quem está livre dos vícios e quer realmente mudar de vida, pode ter uma chance e traçar novos objetivos. Genilson está na rua há 23 anos, saiu de Ponte Serrada e passou por muitas cidades. Está em Lages há oito anos.

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