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Documentos históricos de São Joaquim quase viram lixo

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Fotos: Núbia Garcia

Uma enorme pilha de papéis esquecida por duas décadas em um canto de uma fazenda, no interior de Bom Jardim da Serra, quase foi parar no lixo sem que ninguém descobrisse a riqueza de materiais que existe ali.

Dentre estes papéis, que foram reunidos por cinco décadas pelo jornalista Joaquim Galete Silva, falecido no fim da década de 1990, estão documentos com registros históricos, livros, jornais e fotos que retratam diversas épocas da cidade de São Joaquim.

O resgate dos papéis e posterior levantamento dos mesmos está sendo feito pelo sobrinho de Joaquim, o também jornalista Glauco Silvestre Silva, 44 anos. O que mais chamou a atenção até agora foi, justamente, o documento mais antigo identificado até o momento.

Trata-se de um comprovante da venda de um escravo, realizada em Lages, no ano de 1893, cinco anos após a abolição da escravatura no país e seis anos após a emancipação de São Joaquim (que, até então, era parte do território da Vila de Nossa Senhora das Lagens – hoje Lages).

O documento escrito à mão apresentava detalhes como o local de onde estava vindo (São Paulo) e apontava as características físicas do homem que estava sendo vendido: ele tinha 25 anos e era considerado apto para trabalhos braçais. “Me chamou muito a atenção porque é o documento mais antigo que encontrei até agora e, justamente, por retratar uma parte tão triste da nossa história”, avalia Glauco.

Joaquim foi jornalista e assessor parlamentar. Muito culto e interessado por diversas áreas do conhecimento, sempre gostou de colecionar documentos. Sua cautela era tamanha, que boa parte da papelada foi cuidadosamente guardada em pastas do tipo portfólio, separada dentro de folhas plásticas.

Muitas das fotos estão coladas em folhas timbradas com o nome de Joaquim e com legendas feitas à máquina de escrever, descrevendo sobre o que se tratam e em que ano ou época foram tiradas.

À época da morte de Joaquim, outros objetos que ele colecionava já haviam sido doados ao município de São Joaquim. Sua coleção de vinis foi entregue ao Museu Histórico Assis Chateaubriand, e um quadro pintado por Di Cavalcanti, que pertencia ao jornalista, está na Casa de Cultura da cidade.

Glauco também é colecionador

As coincidências entre tio e sobrinho vão além da profissão. Assim como Joaquim, Glauco também gosta de colecionar objetos antigos e guardar documentos. No seu acervo pessoal estão cartas que outro tio escrevia para seu pai, à época da Ditadura Militar no Brasil.

“Esse meu tio morava em São Paulo e sempre escrevia para o meu pai, que estava aqui no interior, contando sobre os rumos que a ditadura estava tomando na maior cidade do país.” Sobre o acervo do tio, Glauco pretende catalogar tudo, digitalizar os documentos mais importantes e, futuramente, escrever um livro contando a história a partir destes materiais.

No meio de tantos papéis, Glauco encontrou o registro da venda de um escravo, realizada em 1893, cinco anos após a abolição da escravatura no país

Trabalho de levantamento e catalogação é lento

No arquivo montado por Joaquim há documentos relacionados à sua família, como fotos e catálogos com a árvore genealógica, e também documentos de valor histórico para o município e a região, assim como a cópia do projeto para construção da Igreja Matriz e os registros de sua construção e das festas da paróquia, além de livros que relatam a trajetória da Festa Nacional da Maçã, desde os tempos em que ainda era apenas a Mostra da Maçã.

Glauco acredita que conseguiu abrir cerca de 30% das pastas para analisar seus conteúdos e que o trabalho de verificação de todo o material pode levar meses. “Me lembro de ver estas pastas e papéis na casa do tio quando eu ainda era criança, mas nunca soube do que se tratavam. Quando fui buscar, imaginei que teria apenas fotos, mas fiquei surpreso com o que acabei encontrando.”

Ao todo, são cerca de 100 pastas, que chegam a aproximadamente 200 quilos de papel.

Desde a morte de Joaquim, tudo tinha ficado guardado na casa de uma das irmãs. Mas, no ano passado, ela decidiu reformar o imóvel e perguntou para Glauco se ele teria interesse em descobrir do que se tratava aquela montanha de papéis. “Eu cheguei na casa e já tinham começado a reforma. Fui de camionete, coloquei tudo na carroceria e trouxe para casa. Foi aqui que comecei a organizar e abrir um por um e fui descobrindo a quantidade de coisas relevantes que meu tio guardou por cinco décadas.”

No meio de toda a papelada, há um grande acervo dos principais jornais da Serra, ao longo dos 50 anos em que Joaquim colecionou todos estes materiais. Dentre eles, há diversos recortes, cópias e edições completas do Correio Lageano. Uma das edições já encontradas e catalogadas por Glauco é de abril de 1991, cuja capa traz um apelo para o então presidente da República Fernando Collor de Mello, para que conclua as obras de construção da BR-282, que liga o Oeste ao litoral do Estado.

Ao todo, são cerca de 100 pastas, que chegam a aproximadamente 200kg de papel

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