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Serra Catarinense aposta na recuperação dos presos

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Fotos: Bega Godóy

Atualizado às 15h35

Anunciado pelo Governo Federal, o Mutirão Carcerário iniciará por Ceará, Goiás e Pará. Não há data para ser realizado em Santa Catarina, e na Serra Catarinense, autoridades acreditam que seja desnecessário, em função da atuação permanente da Justiça com a criação da Vara Especializada em Feitos da Execução Penal da Serra Catarinense. Apesar dos presídios trabalharem acima da capacidade, avaliam que a ação não traria um efeito positivo para a sociedade. A aposta é em trabalhos de ressocialização.

A proposta do mutirão é focar em presos que cometeram pequenos delitos e que podem ser recuperados pela sociedade. Mas, segundo as autoridades, crimes contra o patrimônio e relacionados ao tráfico ilícito de entorpecentes são a maioria, tanto nos presídios de Lages como na penitenciária de São Cristóvão do Sul.

O ministro de Segurança Pública, Raul Jungmann, pediu aos governadores de todos os estados um relatório sobre a situação dos presídios e da violência. As unidades da federação que não repassarem os dados vão ficar sem receber recursos da União. O pedido, leva a entender que mesmo que o mutirão não seja interessante para Santa Catarina pode se tornar uma exigência de Brasília.

O gerente do presídio regional de Lages, Diego Costa Lopes confirma que há 233 internos e 32 mulheres. Ele não acredita ser necessário um mutirão em Lages, por ora. “ Pela eficiência do trabalho do judiciário e da corregedoria na região”, argumenta.

Para o gerente do presídio Masculino de Lages, Paulo Roberto de Oliveira, o número de presos acima do indicado não atrapalha os trabalhos. “ Apesar de estarmos acima da capacidade a situação está controlada e confortável para se trabalhar. O que falta é estrutura para contemplar empresas que ofereçam trabalho para os apenados”, resume.

Na visita da equipe do Correio Lageano, no Presídio Masculino, presos fizeram o sinal que as celas estão lotadas

 

Situação em São Cristóvão do Sul

A unidade está com 1.622 apenados, dentre eles 53 são presos provisórios. A grande maioria dos detentos são presos que já possuem condenação. A unidade foi projetada para atender 1.399 internos. Segundo o Juiz da Vara Regional de Execuções Penais de Curitibanos, Juliano Schneider de Souza, “apesar da lotação acima do inicialmente previsto, com as melhorias realizadas na estrutura física das unidades, a situação ainda é boa”, assegura.

Agora, mutirão não é necessário

Sobre as audiências de custódia adotada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o presidente da comissão dos Direito Humanos da OAB, Afranio Camargo, comenta que é uma medida paliativa para justificar uma pressão internacional quanto ao elevado número de presos provisórios no Brasil, pois objetivam verificar a legalidade da prisão, se houve abuso policial, se há alguma condição favorável a liberação do preso, sem se ater a verdadeira periculosidade ou no interesse da sociedade, provocando um incentivo ainda maior à impunidade.

Para que não haja deficit de vagas nos presídios, Afranio defende que é preciso construir novas unidades prisionais, com a devida separação por gênero, tipos de crime, prisão e regime prisional. “Aliada a uma reforma penal e processual penal que de fato repreenda o indivíduo infrator, coibindo a reincidência e a criminalidade”, reafirma.

Presidente da comissão dos Direito Humanos da OAB, Afranio Camargo

Ainda de acordo com avaliação de Afranio, as unidades prisionais da região, incluindo a penitenciária de São Cristóvão do Sul são satisfatórias, pois observam as condições mínimas de direitos humanos. “Há deficit de vagas, numa clara deficiência de local para que possa ter uma separação efetiva dos tipos de presos e de prisões, a exemplo do preso por pensão alimentícia, que é uma prisão civil, e não possui um espaço adequado. Acho que a maior problemática é a falta de espaço físico adequado, muito embora se tenha verificada efetiva melhora”, diz ele.

Afranio também acredita que o mutirão na região seja desnecessário. “Desconhecemos que haja uma programação oficial no município, acreditamos, informalmente, que Lages tenha sido excluída por não ter problemas relevantes”.

Presos que trabalham

No presídio regional de Lages, no Bairro São Cristóvão, há 233 internos e 32 mulheres, 42 estão trabalhando por meio de convênio do Governo do Estado, na empresas do ramo da madeira: Cristavel e Dinda.

No presídio masculino cerca de 12% a 15% dos 352 apenados estão trabalhando. O problema da unidade é não ter espaço maiores para contemplar a vinda de empresas ofertando trabalhos aos presos. Por serem na sua maioria do regime fechado ou provisório, não há a possibilidade de saírem para trabalhar fora da unidade, como ocorre com os presos do regime semiaberto. O trabalho tem que ser proporcionado na unidade prisional.

O projeto inicial da unidade não contemplou espaço apropriado para a parte laboral. E alguns foram adaptados (trabalho com direito a remissão e um salário), por essa razão são menos de 40 presos trabalhando. Na unidade há as empresas conveniadas com a Secretaria de Justiça e Cidadania: Grafine, Vida Mais; que produzem sacolas de papel e a própria Reviver, responsável pela parte técnica. A Reviver disponibiliza vagas na lavanderia e na parte limpeza externa de galerias.

No Presídio Regional de Lages estão 233 homens e 32 mulheres

Ressocialização emperra na falta de espaço

Para o juiz corregedor, Juliano Schneider de Souza, a ressocialização do preso passa necessariamente pelo interesse dele em desviar-se do caminho do crime. O Estado, segundo ele, dentro de suas possibilidades, deve auxiliar nesse trajeto. “Para tanto, o Conselho da Comunidade de Lages, sob a presidência da Dra. Márcia Werneck, está elaborando diversos projetos para implementar nas unidades prisionais da cidade.”

Uma alternativa apontada pelo juiz seria a utilização do antigo prédio da Casan, no Bairro São Cristovão. Mas a Lei Estadual 15.942/2012 determina que aquele espaço seja utilizado para a transferência da sede da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional de Lages.

Assim segundo o juiz, sofre com isso a sociedade que se vê refém daqueles que vão para o cárcere e de lá saem ainda mais perigosos. “Se é certo que lugar de ‘bandido’ é na ‘cadeia’, devemos todos refletir: como queremos que esse indivíduo esteja quando retornar ao convívio social, porque um dia isso vai acontecer.”

Entrevista

Juiz da Vara Regional de Execuções Penais de Curitibanos, Juliano Schneider de Souza

Na sua opinião, a possibilidade de criminosos que cometeram pequenos delitos forem soltos representa uma preocupação para a sociedade?

A soltura daqueles que alcançaram este direito estabelecido em lei e que não obtiveram qualquer qualificação enquanto encarcerados, sempre será motivo de preocupação para a sociedade.

O que o senhor acha do uso de tornozeleiras?

A tornozeleira eletrônica é de grande valia, porquanto permite a fiscalização dos presos provisórios e daqueles que não possuem condições de resgatar reprimenda no interior das unidades. Ademais, evita-se que sejam contaminados pelos atuais malefícios produzidos pelo cárcere, notadamente o ingresso em facções criminosas. Atualmente possuímos 24 apenados que estão fazendo o uso da tornozeleira eletrônica, entre eles 13 da Vara Regional de Execuções Penais e os demais de comarcas diversas da região.

Na sua opinião, a audiência de custódia ajudou na diminuição da população carcerária?

De forma alguma, na minha opinião a audiência de custódia foi um grande equívoco porque a finalidade dela é avaliar eventual abuso de poder por parte dos policiais no momento da prisão. Tal responsabilidade sempre foi bem exercida pelos Delegados de Polícia, não havendo razão de se transferir tal ônus para o Juiz de Direito. O número reduzido de estudos sobre a matéria (eficiência da audiência de custódia), indica que houve acréscimo da população carcerária por conta do ato, momento também no qual o magistrado verifica a necessidade de manutenção ou não da prisão. Anteriormente à referida audiência, pelo menos no Estado de Santa Catarina, os Juízes sempre atuaram em regime de plantão e apreciavam os flagrantes em exíguo espaço de tempo. Trata-se de ato desnecessário e dispendioso para o erário.

O número ainda é pequeno, mas alguns detentos já trabalham. Na imagem, atividade do Presídio Masculino de Lages