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Mareli Graupe: Trabalho contra os diferentes tipos de violência

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Mareli Graupe, doutora em Educação e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Gênero, Educação e Cidadania na América Latina (Gecal) concedeu entrevista ao Correio Lageano para tratar de assuntos como gênero, violências sofridas pelas mulheres e defende o 8 de março como um dia de luta e resistência.

Correio Lageano: Nesta semana, estudantes do CAV/Udesc fizeram uma manifestação por conta dos casos de assédios nas proximidades da universidade. Qual a importância de as mulheres lageanas se unirem para manifestações?

Mareli Graupe: Muito importante. Apesar de o foco ter sido ao entorno, sabemos que tem violência também dentro das instituições e das universidades, porque é lógico, se a violência está na rua, essas pessoas também estão em outros locais. É muito importante esse tipo de manifestação, de movimento, e gerou vários comentários. É essencial que a comunidade entenda o sentido, que não é porque é uma mulher, que é uma estudante que está na rua que ela merece ser desrespeitada, independe da vestimenta, se estiver com roupa curta ou nua, mesmo assim, nenhum ser humano tem o direito de desrespeitar ou cometer violência, seja sexual, seja física ou psicológica. Assobios e fiu-fius são um desrespeito que está muito atrelado ao subjetivo, claro que às vezes nós entendemos como um elogio, mas depende de quem veio esse elogio, a intenção, a relação e o que eu espero da pessoa, agora, de um estranho, mesmo de um não estranho, porque tem o assédio moral e sexual em todos os locais, até na sala de aula, cometido por professores, por colegas e estudantes. Porque ninguém merece viver com violência.

Lages é uma das cidades mais violentas do Estado para as mulheres viverem. Por que vivemos essa realidade?

Primeiro precisamos entender o conceito de violência, porque isso também é uma construção social, cultural e histórica, as mulheres nunca foram vistas como sujeitos de direito, até a década de 1990, isso é ontem na nossa história. O que era entendido como violência contra as mulheres era a morte, o homicídio de mulheres, que hoje nós usamos o termo feminicídio. Todo e qualquer outro tipo de violência, física, moral, institucional, isso não era entendido como violência, porque a mulher não era gente, era um ser inferior. Na nossa sociedade, infelizmente, tem muito desse resquício cultural, e para mudar uma forma de pensar, mudar um paradigma, é necessário, no mínimo, 500 anos, se não abordarmos esses temas com frequência, não vamos mudar nossa cultura. Se aqui em Lages ainda tem muita violência contra a mulher, isso é cultural, é histórico, mas pode e deve ser mudado, depende das discussões e dos movimentos.

Qual a importância de as mulheres usarem a data do 8 de março para a realização de ações em favor da igualdade de gênero?

A data do 8 de março é muito importante para lembrarmos de mulheres que morreram em prol da causa. A gente (mulheres) até tem direitos iguais em termos de legislação, mas não quando falamos em equidade de gênero, ou seja, queremos que tanto os homens como as mulheres assumam as responsabilidades, seja na casa, seja com os filhos. A sociedade não é segura para as mulheres. Nós do Gecal enfatizamos que o 8 de março não é dia de dar flores, dar chocolates ou parabéns, é dia de luta e de resistência. Temos o movimento do 8M que seria um dia de greve internacional, ou seja, que o mundo pode parar se nós mulheres não trabalharmos. Nós temos de nos empoderar nesse sentido e pensar um pouco, por que muitas pessoas ainda nos dão parabéns e presentes e que não deveria ser isso, deveria ser um dia de resistência e de luta e é essa a mensagem que o Gecal quer deixar. O 8 de março foi comemorado a primeira vez em 26 de agosto de 1910, numa conferência, depois comemorado em 1917 na Rússia, mas sempre com esse caráter de luta e de busca de maiores condições sociais e econômicas. A vida não é tão justa com as mulheres, mas deveria, pois somos maioria no Brasil, estamos parindo as crianças. Nós somos a maioria em muitas instâncias, mas sofremos muitas violências. A gente pode romper esse ciclo por meio da educação, não somente a formal, por meio de campanhas. Essa é a mensagem da data, se emancipar, se empoderar e se conscientizar que nenhuma pessoa, nenhuma mulher merece viver com violência.