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Abrigo de inverno acolhe até animais de estimação

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Abordagem da equipe de assistência social acontece todas as noites da semana Fotos: Bega Godóy

Atualização 09h55

A frente fria que derrubou as temperaturas nos últimos dias em Lages refletiu no aumento do número de atendimentos à população em situação de rua. As equipes de Abordagem Social 24 horas da Secretaria de Assistência Social e Habitação, através da Diretoria de Proteção Social Especial de Alta Complexidade, disponibiliza o Serviço de Proteção em Situações de Emergência, conhecido como Abrigo Temporário de Inverno. O abrigo fica na Avenida Papa João XXIII, nº 1352, Bairro Ipiranga, no antigo Seminário Diocesano e já chegou a acomodar mais de 50 pessoas.

Desde a segunda quinzena de junho e pelo terceiro ano consecutivo, a equipe de abordagem social da cidade busca identificar as pessoas em situação de rua para convidá-las a usar o serviço. Não é uma tarefa fácil. Nem todos estão dispostos a aderir, uma  vez que, não é uma imposição.

 

A reportagem do Correio Lageano acompanhou a assistente social Danielle Hoffman e o motorista André, na noite de quinta-feira (12), quando os termômetros marcavam 5º C. Foram duas horas de buscas e quatro abordagens. Também realizaram as buscas ativas, que são visitas em rotas pré-estabelecidas denominadas pela equipe como “mocó”, na Praça Joca Neves, Praça João Ribeiro  e em casas abandonadas.  No abrigo, 42 pessoas estavam usufruindo do serviço. O uso dos serviço não tem limitação, ou seja, pode ser usado todos os dias.

 

Maioria são lageanos

Cada pessoa em situação e rua história e motivação diferentes do que os levou a escolher a rua para morar, porém, o uso de substância psicoativa está quase sempre relacionada ao contexto. A maioria, homens lageanos com idades entre 20 a 40 anos.

As desculpas para não ir para o abrigo também são muitas: vão trabalhar, buscar a família, estão esperando resposta de um negócio, e interessante: tudo previsto para o outro dia.

Há quem argumente que tem animais de estimação e não podem levá-los. Esse pretexto não “cola mais”, pois no abrigo há três casinhas para cães e os animais são acolhidos também. Para lá são levadas as pessoas que aceitam a abordagem, demandas espontâneas, as encaminhadas pela Polícia Militar e Defesa Civil e migrantes que desembarcam na Rodoviária e não tem dinheiro e nem para onde ir. O local tem capacidade para 100 pessoas e acolhe inclusive mulheres. A ideia é que o espaço esteja disponível para esse público até setembro.

Frio intenso aumenta a procura por acolhimento

O artesão Fernando Spíndola, por exemplo é gaúcho de Porto Alegre. Despachado e receptivo, o jovem contou que trabalha no Calçadão da Praça João Costa vendendo seus produtos. Seu desejo era conseguir passagem para Florianópolis onde deslumbra melhores oportunidades. Enquanto a viagem não se realiza, Fernando passa as noites sob a marquise do Banco Brasil, no Centro. Um cama com vários cobertores e sua mochila recheada de matéria prima para a confecção de artesanato são suas únicas companhias. Ele que esta há dois dias em Lages recusou a ajuda.

Acostumado a usar o serviços da abrigo temporário, G.K foi acolhido pela terceira vez essa semana. O homem de 31 anos, é de Lages, e contou que está “brigado” com a esposa. Disse que mora no Bairro Copacabana, não recebe nenhum benefício do Governo e passa por tratamento de saúde em função de um acidente com arma branca. Estava na Emergência do Hospital Nossa Senhora dos Prazeres e chamou a equipe de abordagem para levá-lo ao abrigo, assim que foi liberado do seu tratamento. Durante o trajeto falou muito e principalmente em “tomar um rumo para a vida”. Chegou com fome, jantou e foi dormir.

Como os trabalhos de abordagem são diários a equipe já está bem envolvida com os usuários e conhece cada um desde suas manias e especialmente seus “mocós”.

A equipe é incansável e insistente. Mesmo diante de recusas de ajuda anteriores, voltam ao local.  Quase toda noite seu Wilson Floriani de Lima recebe a visita da abordagem. Há seis meses em situação de rua, se recolhe num cantinho de uma loja na Avenida Luís de Camões, no Bairro Coral. Beneficiário do Bolsa Família, o homem de 37 anos tem familiares em Lages e, segundo ele, não os procura porque não quer incomodar. “Eles têm a vida deles”, argumenta ao contar que tinha emprego num sítio, mas com a morte do patrão teve que voltar para a cidade. “Nesta sexta acho que vai dar certo um trabalho que tô vendo”, antecipa.

O animal de estimação também é acolhido

O caso mais curioso é do seu Ubiratan José Gomes o Bira  e seu filho Alican. Eles vivem em situação de ruas há décadas. Seu Bira foi o primeiro a usar a rua como moradia, mais tarde o filho o acompanhou. A dupla dorme na frente da Igreja São Cristóvão, no Bairro de mesmo nome. Na entrada montaram praticamente um acampamento. Lá tem de tudo, uma bicicleta, uma “gaiota” para carregar seus objetos durante a peregrinação diária e outros objetos que não pode-se identificar, pois estavam debaixo e uma lona preta.

No começo ambos foram receptivos. Seu Bira, tentado impressionar com palavras difíceis e às vezes incompreensíveis colaborou, até se chatear e cismar que alguém queria tirar algo dele. O filho entre uma cochilada e outra tentava acalmar o pai. Sem sucesso. O jeito foi deixar os dois se entenderem. Quando a equipe se retirou ele gritou: “O que eu quero é uma casa para morar”.

 

Onde procurar ajuda

A equipe de assistência social faz a abordagem tentado aliviar um pouco a vida dessas pessoas. Em Lages, além do abrigo temporário há o Centro de Referência para População em Situação de Rua (POP), na Rua Juca Antunes Lucena, perto do Ambrósio Material de Construção no Bairro Copacabana. Esses serviços estão previstos na Lei de Tipificação dos Sistema Único de Assistência Social (SUAS)

 

Como ajudar

Situações de risco à vida humana nas vias públicas da cidade podem ser comunicadas através do plantão de abordagem social pelos telefones: 98406-2980 e 99921-1125. É importante o solicitante ter o nome da rua e o ponto de referência para indicar ao atendente.  No abrigo é oferecido refeições, pernoite, banho, roupas e produtos de higiene pessoal.  Funciona das 18 horas às 7h, nos sete dias da semana.

No Centro de Referência para População em Situação de Rua (POP) são oferecidos atividades, alimentação, assistência social e psicológica. O usuário conta com cuidador e educador social. Atende de segunda-feira a sexta-feira das 8h às 18h.